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Permuta com incorporadoras e a armadilha tributária

09 de agosto de 2025

Um novo entendimento da Receita Federal pode levar ao pagamento dobrado de imposto, criando insegurança jurídica para donos de terrenos que realizarem permutas com incorporadoras.

 

Muito usual no mercado imobiliário a realização da permuta, onde há uma “troca” entre o proprietário de um imóvel (ou de um terreno) e a incorporadora, que deseja construir um empreendimento no local, ou seja, o proprietário cede seu imóvel ou terreno para a incorporadora em troca de unidades futuras do imóvel a ser construído.

 

Mais especificadamente há, ainda, a permuta financeira onde o proprietário do terreno não recebe um valor fixo à vista, como em uma venda tradicional, mas receberá mensalmente um percentual conforme as vendas realizadas pela incorporadora, ou seja, o preço de alienação é indeterminado.

 

É uma parceria na qual o dono do imóvel ou terreno entra como “sócio informal” do negócio, assumindo riscos, acompanhando resultados e dependendo do êxito das vendas.

 

Há, contudo, uma armadilha tributária nessa operação, exigindo atenção especial por parte de um advogado especialista.

 

A Receita Federal respondeu, por meio da Solução de Consulta COSIT 89/2025[1], que a natureza da operação não se submete à vontade das partes ou à nomenclatura que estas decidam adotar no contrato e que o Direito Tributário não se curva à semântica privada, mas sim à substância dos atos jurídicos praticados.

 

Assim, a Receita tem tratado esses proprietários apenas como vendedores de imóvel, cobrando deles o Imposto de Renda sobre ganho de capital, que pode chegar a 22,5%.

 

Afirmou a Receita nessa consulta que: “Na tributação do ganho de capital na alienação de imóvel sob a forma de pagamento parcelado, com valor proporcional à participação do imóvel no total do empreendimento, o alienante deve, inicialmente, apurar o valor da alienação em conformidade com a operação estipulada no contrato de compra e venda, caso haja, ou o valor de mercado, em conformidade com o disposto nos incisos I e II do art. 19 da IN RFB nº 84, de 2001[2].”

 

Já a incorporadora, por sua vez, é beneficiada pelo Regime Especial de Tributação (RET), com alíquota unificada de 4%, conforme prevê a Lei nº 13.970/19, que alterou a Lei 12.024/09[3], que regula as incorporações imobiliárias, porém, muitas vezes, esse percentual também é repassado para o vendedor.

 

Há uma espécie de bitributação disfarçada, pois a Receita desconsidera que o dono do terreno está economicamente integrado ao empreendimento, assumindo os mesmos riscos da incorporadora, e aplica sobre ele uma tributação mais pesada, como se ele estivesse apenas vendendo um imóvel.

 

O RET foi criado não apenas para simplificar a arrecadação no setor habitacional, mas também como política social, voltada à promoção do Minha Casa Minha Vida e à segurança jurídica das incorporações e, quando o proprietário se associa ao projeto, ele deveria ser tratado como co-incorporador e ter direito ao mesmo regime fiscal.

 

A situação se complica porque, ao repassar ao proprietário o valor correspondente à sua participação, a incorporadora já deduz a alíquota de 4% — o que significa que o mesmo valor está sendo tributado nas duas pontas, violando aos princípios constitucionais da capacidade contributiva e da isonomia, punindo quem contribui para a geração de riqueza no país.

 

Essa interpretação da Receita não se mostra adequada e não é a melhor leitura da legislação, sendo possível se judicializar para que o proprietário busque ser reconhecido como co-incorporador, ou, ao menos, revisar o contrato de permuta para minimizar os impactos tributários.

 

Portanto, é essencial que os proprietários façam uma consultoria especializada antes de concretizarem uma permuta com uma incorporadora, principalmente para entenderem a tributação envolvida.

 

HAROLDO LOURENÇO

Advogado e sócio fundador do BLP Advogados

 

[1] https://normasinternet2.receita.fazenda.gov.br/#/consulta/externa/144709

[2] Art. 19. Considera-se valor de alienação:

I – o preço efetivo da operação de venda ou de cessão de direitos;

II – o valor de mercado, nas operações não expressas em dinheiro;

[3] “Art. 2º-A.  A partir de 1º de janeiro de 2020, a empresa construtora que tenha sido contratada ou tenha obras iniciadas para construir unidades habitacionais de valor de até R$ 124.000,00 (cento e vinte e quatro mil reais) no âmbito do Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV), de que trata a Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009, fica autorizada, em caráter opcional, a efetuar o pagamento unificado de tributos equivalente a 4% (quatro por cento) da receita mensal auferida pelo contrato de construção.

  • 1º O pagamento mensal unificado de que trata o caput deste artigo corresponderá aos seguintes tributos:

I – Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ);

II – contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep);

III – Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); e

IV – Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins).